Pacote incentiva a cabotagem para aliviar rodovias

O governo prepara um conjunto de medidas de estímulo à navegação de cabotagem para desafogar as estradas brasileiras e ampliar o escoamento de produtos pela costa brasileira. A cabotagem é a navegação entre portos dentro do território nacional e é vista como a melhor maneira de se diminuir o fluxo de caminhões nas estradas brasileiras. Afinal, mar e rios não têm buracos e um único navio de contêineres é capaz de tirar das rodovias cerca de 2,5 mil caminhões.
Do extremo sul do Brasil até o porto de Manaus, pelo rio Amazonas, são 10 mil quilômetros que podem ganhar novas linhas de navios e integrar o transporte marítimo de cabotagem com as três hidrovias que atendem o centro-norte e centro-oeste do País: Tocantins-Araguaia, Tapajós-Teles Pires e Madeira.
No Brasil, apenas 13,8% da carga (tonelada por quilômetro) são transportados por água. Pelas rodovias, passam 61,8% de toda a carga transportada no País. A Confederação de Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) estima que cerca de 5 milhões de toneladas de grãos adicionais poderiam ser transportados dentro do País pela navegação de cabotagem em rotas do Sul para Nordeste e Norte do País.
INDÚSTRIA NAVAL
O pacote em estudo no governo prevê medidas de estímulo à indústria naval brasileira e a criação de um Fundo Garantidor para cobrir o risco de o estaleiro não entregar o navio encomendado. “O fundo vai cobrir parte desse risco de o estaleiro não entregar o navio. Estamos discutindo qual será o seu perfil”, afirma o secretário de Acompanhamento Econômico do ministério da Fazenda, Nelson Barbosa. A idéia inicial é de um fundo com cerca de R$ 400 milhões, que, de acordo com informações que a Fazenda recebeu dos armadores, seria suficiente para suprir a atual demanda. O fundo poderá receber recursos do Fundo de Marinha Mercante, segundo Barbosa.
O presidente do Sindicato Nacional das Empresas de Navegação Marítima (Syndarma), Hugo Figueiredo, aplaude a proposta. “Este caminho é absolutamente correto”, diz ele, destacando que o problema de falta de garantias dificulta o financiamento da aquisição de navios pelas empresas de cabotagem.
Também estão em estudo medidas de desoneração tributária, entre elas, de insumos importados utilizados na produção de navios para a cabotagem e do combustível usado nessas embarcações. Hugo Figueiredo explica que, para os armadores, os custos de aquisição de navios e de combustíveis são os principais problemas enfrentados pelo setor. “É preciso trabalhar para dar mais competitividade ao setor”, afirma o presidente do Syndarma.
O governo estuda ainda a possibilidade de flexibilizar algumas amarras que existem hoje na legislação, como barreiras à importação de navios novos e usados fabricados no exterior. Uma maior abertura da cabotagem enfrenta, no entanto, forte resistência da indústria naval e dos armadores nacionais e também em alguns setores do governo. “A importação não é proibida. É só pagar o tributo”, diz o secretário de gestão do ministério dos Transportes, Miguel Masella.
Para ele, com a estabilidade de preços e com os juros menores, as condições para o desenvolvimento da cabotagem no Brasil estão mais propícias. Segundo Masella, no passado a hiperinflação desestimulava esse meio de transporte porque ele consome mais tempo. “A cabotagem perdia até para o avião”, afirma. O mesmo raciocínio vale para os juros altos.
Por falta de renovação, a frota brasileira encolheu nos últimos anos e conta hoje com apenas 132 navios. Quase metade dos navios é da Petrobrás, usados nas operações da própria companhia.
FORA DA ESTRADA:
13,8% da carga (tonelada por quilômetro)são transportados por água;
61,8% da carga são transportados pelas rodovias;
2,5 mil caminhões podem ser substituídos por um navio de contêineres;
Imposto alto reduz capacidade de competição;
Para criar as medidas de estímulo à navegação de cabotagem, o governo preparou um diagnóstico sobre o setor no Brasil. O relatório, elaborado por um grupo de trabalho criado em 2005, aponta que o custo de operação dos navios brasileiros esta bem acima dos padrões internacionais. Dessa forma, se desenhou no País um círculo vicioso: não há freqüência de navios, o que leva à falta de cargas, que, por sua vez, são transportadas a custos elevados. Assim, o modal marítimo não deslancha.
Muitos navios usados na cabotagem são oriundos de empresas que faziam a chamada navegação de longo curso (entre países). Com a expansão da frota de navios das “bandeiras de conveniência”, uma espécie de paraíso fiscal para os transportadores de longo curso, as empresas brasileiras passaram a operar só na cabotagem.
A tributação pesada foi apontada como um dos motivos dos fretes elevados, o que reduz a competitividade ante outros transportes, como o rodoviário. O frete entre Rosário, na Argentina, e o Recife, com cerca de 5,2 mil quilômetros de distância, considerado de longo curso, custa menos que o frete entre Paranaguá e o Recife, cuja distância é de cerca de 2,8 mil quilômetros, ou semelhante ao frete Paranaguá-Xangai (China).
Para o consultor da CNA Luiz Antonio Fayet, o alto preço nos fretes da cabotagem é uma das razões pelas quais o trigo, o milho e o arroz produzidos no Sul não conseguem competir com os importados pelo Nordeste. Isso obriga o governo federal a mobilizar elevados recursos para resolver problemas de comercialização. Como os fretes de longo curso são mais baratos, uma das soluções tem sido vender para fora do País o milho e o trigo que falta em outras regiões do Brasil.
O diretor da Antaq, Murilo Barbosa, reconhece que os custos da cabotagem são elevados e isso impacta o frete, mas pondera que o frete hoje, por conta da demanda chinesa, está elevado em todo o mundo. “A competição está difícil até com o rodoviário”, afirmou.

Fonte: NTC e Jornal O Estado de São Paulo

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