Maior porto europeu ignora crise e segue com expansão

Dez anos atrás, quando foram feitos os planos para dobrar a capacidade do porto desta cidade holandesa, o transporte de contêineres crescia 10% por ano. Desde então, a recessão mundial arrasou a indústria de transportes marítimos e, embora o movimento já comece a se recuperar, analistas do setor não preveem que o crescimento ultrapasse 6% nos próximos dez anos.
Mas a expansão do porto de Roterdã, chamada Maasvlakte 2 e avaliada em US$ 4,1 bilhões, continua a todo vapor, com guindastes gigantescos instalando blocos do tamanho de baleias e dragas criando terrenos onde antes fluía o Mar do Norte.
"Nunca houve um plano B", diz Sjaak Poppe, porta-voz do porto.
Sem contar os riscos - e há vários -, as autoridades de Roterdã estão confiantes de que crescer será crucial para tirar proveito até mesmo de uma recuperação lenta do comércio mundial. Num mundo traumatizado pela recessão, em que austeridade é a norma, a marinha mercante busca mais do que nunca as economias de escala. Isso, argumentam as autoridades do porto, demanda instalações gigantescas de grande calado como a de Roterdã.
A cidade já tem o maior porto de contêineres da Europa, processando ano passado o equivalente a 9,7 milhões de contêineres de 20 pés, o que o coloca à frente de Antuérpia, na Bélgica, por onde passaram 7,3 milhões de contêineres, e Hamburgo, com 7 milhões. Maasvlakte 2, que autoridades locais dizem ser o maior projeto de aterramento do mundo, é crucial para manter os contratos de empresas como a petrolífera Neste Oil Oyj e a transportadora DP World Ltd.
Os 4 quilômetros de novas docas em Maasvlakte, cujo nome vem de um rio próximo, permitirão que navios descarreguem mais 8,5 milhões de contêineres de 20 pés por ano. A expansão é parte de um plano para "dobrar ou triplicar" o tráfego de contêineres nos próximos 20 anos, diz Poppe.
A construção começou dois anos atrás e as primeiras docas devem ficar prontas em 2013, embora o projeto só deva ser totalmente concluído 20 anos depois disso. Quando a expansão for finalmente concluída, o porto será do tamanho de 2.800 campos de futebol.
O projeto tem seus riscos. Com o declínio de 12% no comércio mundial ano passado, as empresas de transporte marítimo perderam cerca de US$ 20 bilhões. E, embora o volume mundial de contêineres tenha voltado ao nível de 2008, boa parte disso é movimentado na Ásia ou entre a Ásia e a América Latina. Dos 20 portos mais movimentados do mundo, 13 são asiáticos.
"A Europa e os Estados Unidos são gigantes lentos", diz Philip Damas, da londrina Drewry Shipping Consultants Ltd. Um porto como o de Roterdã, acrescenta, "se arrisca a ficar marginalizado" se as compras europeias de produtos asiáticos desacelerarem.
Roterdã enfrenta concorrência da Antuérpia e de Hamburgo para atender ao coração industrial da Alemanha e ao mercado consumidor do noroeste da Europa. Roterdã "vai crescer se a economia mundial crescer, não porque vai roubar mercado", diz Eddy Bruyninckx, diretor-presidente do Porto de Antuérpia. Portos fluviais como o seu "têm menos vento, são mais produtivos e ficam mais perto de outras conexões", acrescenta.
A localização no mar de Roterdã o torna vulnerável a tempestades. Mas ela também oferece águas mais fundas, "o que significa que você pode seguir direto para o oceano", diz Kim Fejfer, diretor-presidente da APM Terminals, divisão da dinamarquesa A.P. Moller-Maersk AS. "E as rotas de transporte marítimo estão usando navios cada vez maiores." A APM já aluga espaço nas novas docas de Roterdã.
A tendência de crescimento dos navios é crucial para Maasvlakte 2. Analistas do setor marítimo calculam que o número de navios capazes de transportar 15.000 contêineres de 20 pés - o dobro da capacidade da maioria dos cargueiros atuais - vai quintuplicar até 2013. Essa expansão do espaço ajuda a baixar o custo das empresas de transporte.
A Maersk é parte de um grupo de empresas comandadas pela DP World, de Dubai, que está gastando US$ 8,3 bilhões para construir armazéns, docas e refinarias além dos US$ 4,1 bilhões que o porto pretende gastar para aterrar a área. A capacidade de receber navios gigantes foi o que atraiu as empresas a Roterdã, diz um porta-voz da CMA-CGM SA, empresa francesa que é a segunda maior transportadora marítima do mundo em volume, depois da Maersk.
O Maasvlakte 2 também captou o interesse da finlandesa Neste Oil, que está construindo uma refinaria nas novas docas para transformar óleo de palma, gordura animal e outras matérias-primas transportadas maritimamente em biodiesel para venda na Europa. Roterdã se tornou "um dos locais mais importantes do mundo para o mercado de óleo", diz a porta-voz da Neste Hanna Maula.
Já as empresas industriais esperam que a capacidade extra de Roterdã ajude a controlar os custos com frete. "Temos acompanhado uma retomada do crescimento do frete, então capacidade adicional é algo positivo para nós", diz Jeffrey Morrison, diretor de logística das divisões Opel e Vauxhall da General Motors Co.
No centro do projeto Maasvlakte 2 está a dragagem do oceano para criar aterros, uma especialidade dos holandeses desde a Renascença.
A área de construção parece um Parque Jurássico de estranhos guindastes, navios e canalizações que bombeiam areia e rocha no que antes era o mar. Engenheiros dizem que sistemas de GPS ainda confundem frequentemente com o Mar do Norte as novas terras criadas lá. Um guindaste fabricado especialmente para o projeto, chamado "arrasa-quarteirão", é um dos mais potentes do mundo. Ele pode levantar de 36 metros de distância um bloco de 40 toneladas, dos quais serão necessários 20.000 para criar o quebra-mar que protegerá o porto das tempestades de inverno.
Duas das maiores empresas mundiais de dragagem são holandesas. E outra empresa do país, a IHC BV, é um dos poucos estaleiros europeus ainda em funcionamento e produz dragas que custam mais de US$ 300 milhões e podem carregar 40.000 toneladas de rocha.
O Maasvlakte 2, batizado dois anos atrás por uma rainha Beatrix em galochas, já se tornou um ícone nacional em meio à lentidão econômica. Um novo centro de visitantes no local - que exibe chifres de mamute da Era do Gelo e bombas descartadas no mar por aviões britânicos da Segunda Guerra voltando da Alemanha - estava previsto para atrair 60.000 turistas este ano. Cerca de 125.000 já foram conhecê-lo.

Fonte: Valor Econômico

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